sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Angola aposta no desenvolvimento das tecnologias nucleares


Prioridade recai na formação de quadros para monitorarem o uso racional da energia nuclear nos diferentes sectores da economia do país


ADÉRITO VELOSO*
Com a aprovação, em 2007, da Lei de Energia Atómica e a promulgação do estatuto da Autoridade Reguladora de Energia Atómica (AREA), o acesso à tecnologia nuclear e a sua utilização ao serviço do desenvolvimento dos diferentes ramos da economia constam das prioridades do executivo angolano.
Apesar de Angola ter sido admitida como membro da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) em 1999, somente a partir de 2007 o país iniciou efectivamente com maior vigor a promoção e desenvolvimento das aplicações de ciência e tecnologia nuclear, através da implementação de vários projectos com a cooperação técnica da AIEA.
Através desta cooperação, foi elaborado o Programa Nacional Quadro do País (PNQ), que constitui a base de referência para o programa de cooperação técnica com a AIEA para o período de 2009-2011. Este plano foi desenvolvido depois de consultas de peritos da agência, junto dos organismos nacionais competentes. A base foi uma análise das necessidades do país em termos de ciência e tecnologia nucleares em relação aos planos nacionais relevantes e aos programas de desenvolvimento sectorial.
Desta consulta resultou um plano que tem como objectivo adequar as prioridades nacionais em termos de tecnologia nuclear ao desenvolvimento sustentável, tendo o foco das actividades de cooperação nas seguintes áreas: desenvolvimento de recursos humanos; consolidação da infra-estrutura legislativa nacional de protecção contra radiações; saúde pública; agricultura; controlo da poluição marítima e terrestre; aplicações das técnicas nucleares nas industriais; segurança nuclear e actividades de apoio geral adaptadas às necessidades nacionais.
Segundo o director-geral da Autoridade Reguladora de Energia Atómica (AREA), Pedro Lemos, o uso de matérias radioactivos têm dado bons resultados aos vários sectores da economia, destacando-se a indústria e a agricultura.

Actualmente, o Governo está engajado em vários projectos nacionais com a cooperação técnica da AIEA, onde se destaca: o fornecimento das capacidades de ensino, desenvolvimento dos recursos humanos, aplicação nos sectores da agro-pecuária e meio ambiente.
“Em Angola, o uso deste tipo de energia (radiação ionizante ou materiais radioactivos) tem trazido benefícios importantes em sectores da economia como a medicina, a agricultura, a indústria, em particular a indústria extractiva, a investigação, o ensino e o desenvolvimento tecnológico”, disse.
A AREA controla e autoriza toda actividade que envolve radiações ionizantes, destacando-se a cooperação técnica no processo de autorização de importação de fontes radioactivas para o uso nas empresas que operam em Angola no sector petrolífero e na extracção de diamantes. O apoio também abrange a aplicação de tecnológia nuclear no sector agrícola.

Para se montar um sistema de radiologia em qualquer hospital do país é preciso a autorização da Alta Autoridade Reguladora de Energia Atómica. A função é verificar se todas as condições requeridas pela AIEA estão observadas.

Indústria Dados apontam que a indústria é a maior usuária das técnicas nucleares. Já que a facilidade de penetração da radiação em diversos materiais e a variação de sua atenuação com a densidade do meio que atravessa os feixes tornam o seu uso conveniente em medidores de nível, espessura, humidade, vazões de líquidos, e no controlo de qualidade de junções de peças metálicas (oleodutos, aeronaves e navios).

Em Angola, toda esta tecnologia está disponível, nas fábricas de papel, na indústria de bebidas, exploração do petróleo e dos diamantes, até nas empresas de energia eléctrica.
“Usa-se a tecnologia na indústria de papel, como medidor da espessura para garantir que todas as folhas tenham a mesma dimensão e na indústria de bebidas, para controlo de níveis de enchimento. Na exploração do petróleo, em processos para determinar o perfil dos solos, e distinguir a quantidade de água, gás e óleo existentes no material extraído; na refinaria de petróleo (onde é utilizado radioisótopos para radiografar juntas de soldaduras), na indústria diamantífera no processo de exploração mineira. É ainda utilizada nas empresas hidroeléctricas, de construção, portos e aeroportos (os chamados scanners)”, sublinhou o director-geral da AREA.
Agricultura
O sector agrícola do país vai contar nos próximos tempos com um laboratório onde serão criados isótopos radioactivos para o melhoramento das plantas, com destaque para a espécie da mandioca. A sede está a ser montada junto ao centro experimental Mazozo, ligado ao ministério da Agricultura, localizado na região de Catete (Luanda), com a supervisão da AREA.

Os isótopos radioactivos emitem radiações, ferramentas importantes na agricultura moderna, já que este fertilizante (isótopo) estável absorve nutrientes nas culturas.

“Estamos a trabalhar na criação de técnicas para a eliminação de algumas pragas que prejudicam a cultura da mandioca. Para esta empreitada estamos a trabalhar com a AIEA no sentido de montar os laboratórios. Cabe-nos (Angola) criar espaços e a AIEA vai-nos fornecer o equipamento, bem como a formação do pessoal a custo zero. O país só vai participar das despesas, pagando as viagens e o alojamento”, informou ao JE o director-geral da Alta Autoridade Reguladora de Energia Atómica.

Pedro Lemos anunciou, por outro lado, estar em curso um projecto de criação de um laboratório de medicina nuclear, avaliado em cerca de USD 300 mil, cujo financiamento e o seu equipamento estão a ser executados pela Agência Internacional de Energia Atómica.

Energia eléctrica
As potencialidades do uso pacífico da enrgia nuclear podem incrementar o défice que o país regista actualmente no domínio da energia eléctrica, numa altura em que o desenvolvimento económico exige do sector da energia um dinamismo acentuado.

Apesar de não constar das prioridades do executivo angolano construir reactores nucleares no país para o fornecimento de energia eléctrica, o também especialista em física nuclear defende que, num futuro próximo, Angola terá de enveredar para este desafio, na medida em que a actual produção de energia eléctrica não satisfaz a demanda.

Actualmente o país tem disponível cerca de um GW de energia e com o desenvolvimento que se está a verificar vai exigir uma produção de energia eléctrica que rondará os cerca de 5 ou 6 GW.

“Não é com barragens hidroeléctricas, muito menos com a utilização das placas (painéis) solares ou energias renováveis que se poderá colmatar a demanda que teremos nos próximos tempos. Então, possivelmente, no futuro se possa enveredar para a construção de um reactor nuclear de uma potência que dependerá das necessidades que o país vai precisar no que toca à energia eléctrica”, informou Pedro Lemos.

Mão-de-obra
O órgão regulador do uso racional da energia atómica no país conta com cerca de 15 trabalhadores, incluindo quatro especialistas (três angolanos e um vietnamita), todos formados em física nuclear.

A AREA, em parceria com a AIEA, está a implementar um programa de formação de quadros que se vai prolongar até ao ano de 2011. Cerca de 20 técnicos especialistas nas diferentes áreas que compõem a energia nuclear estão a ser formados. Neste momento, estão a ser especializados na área de inspecção e fiscalização três técnicos angolanos na Nigéria. No próximo ano, a instituição reguladora de utilização de energia nuclear no país pretende formar no exterior mais 10 especialistas, que actualmente estão a concluir o curso superior de física nuclear, na Faculdade de Ciências da Universidade Agostinho Neto.

“Temos que formar técnicos que vão trabalhar com o sector da indústria, no sector da saúde, na agricultura e por ali em diante”, frisou Pedro Lemos, antes de anunciar que os especialistas não poderão ser recrutados de qualquer maneira. Entre os requisitos principais, destacam-se pessoas a frequentar o curso superior (universitário) de física e que se especializam na área de física nuclear.

Funcionalidade
A Alta Autoridade Reguladora de Energia Atómica não tem implementação em todo o território nacional e o seu principal objectivo é criar os regulamentos necessários a serem utilizados nos diferentes sectores, quer na indústria, agricultura, saúde e outros ramos que têm nos materiais radioactivos o seu principal fornecerdor de energia.

Projectos em curso: fortalecimento do programa de ensino da física nuclear; desenvolvimento dos recursos humanos e apoio à tecnologia nuclear; fortalecimento das infra-estruturas reguladora para protecção e segurança das fontes de radiação; modernização dos serviços laboratoriais para o diagnóstico de doenças animais; programa de monitorização de resíduos de medicamentos veterinários; avaliação da poluição marítima provocada pela exploração de petróleo ao longo da costa; monitorização e controlo das doenças em animais transfronteiriços; melhoria da assistência veterinária a pequenos criadores de gado; efeitos dos biofertilizantes e fertilizantes inorgânicos sobre o crescimento da cultura do milho e feijão no solo ferrolítico do Huambo; melhoria das culturas através da mutação e biotecnologia; estabelecimento do laboratório de testes-não-destrutivos para aplicações industriais; estabelecimento do Centro Nacional de Radioterapia; introdução de técnicas de medicina nuclear em práticas clínicas e apoio ao estabelecimento de capacidades/ competências em radioterapia e medicina nuclear.

Publicado no Jornal de Economia & Finanças*
Fotos: Da Internet

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Estado angolano deve incrementar apoio ao sector privado


BDA financia USD 225 milhões em diversos projectos desde a sua fundação há 3 anos, numa altura em que muitos pedidos de créditos que aquela instituição bancaria tem recebido, não cumprem com os requisitos basicos


Adérito Veloso*


O Presidente do Conselho de Administração do Banco de Desenvolvimento de Angola (BDA), Paixão Franco (na foto), defende que o Estado deve apoiar as iniciativas privadas, permitindo assim o relançamento da economia, assim como tirar milhões de pessoas do mercado informal para o mercado formal, promovendo deste modo o desenvolvimento sustentável do país.
Para o PCA do BDA, falava numa conferencia promovida recentemente em Luanda, pela Agência das Naçoes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), as potencialidades que o país dispõe no que toca à matéria-prima têm promovido o interesse dos investidores a apostarem nos diversos segmentos da economia, destacando-se a agricultura e a indústria transformadora. “O apoio a estas iniciativas por parte do Estado vai promover o aumento do emprego, a melhoria nas remunerações bem como também o combate a pobreza”.
“Os recursos naturais de Angola constituem vantagem comparativa em favor do desenvolvimento do sector privado e o governo está a potenciar estas vantagens transformando-as em competitivas, através da criação de infra-estruturas económicas (portos, aeroportos, estradas e caminhos- de- ferro), concessão de incentivos fiscais e diminuição de taxas alfandegárias. Assim como a estabilização política, económica e social do país”, destacou.
É nesta conformidade que o Banco de Desenvolvimento de Angola adoptou uma política de concepção de financiamento não massificado, mas que garanta o reembolso do crédito a longo prazo, salvaguardando o emprego, combate à pobreza, fome, e reabilitação de infra-estruturas.
“Preferimos actuar desta forma, para identificar-mos nas cadeias produtivas quais são os seus elos fracos e actuar-mos sobre os mesmos. A mensagem que temos transmitido aos nossos colaboradores é de que o mais fácil é conceder o crédito, mas o difícil é administrar, recuperar, negociar, acompanhar e fiscalizar”, afirmou.
Financiamento O Banco de Desenvolvimento de Angola financia directamente projectos com montantes de investimentos acima de USD 5 milhões. Os projectos com montantes inferiores são financiados indirectamente através dos bancos comerciais com os quais o BDA firmou convenções financeiras: BPC, BPA, BCI, BAI, BIC, BFA, Banco Sol, Banco Regional do Keve, Banco Millennium Angola, VT Russo e o BNI.
Dentre os principais projectos privados que o BDA financia, destacam-se: Produção em larga escala de cereais e leguminosas, produção e transformação de mandioca, produção de algodão, indústria de descaroçamento e prensagem de algodão, mecanização agrícola, fornecimento de insumos agrícolas, bovinicultura de corte e de leite, avicultura de frango de corte e postura, caprinicultura e ovinicultura, suinicultura, agroindústria, indústria e serviços, indústria madereira, produção de inertes e artefactos de cimento e prestação de serviços.
Apesar de não ter agências instaladas em todas as províncias, a instituição já recebeu pedidos de financiamento das 18 províncias do país.
As províncias de Luanda, Bengo e Kwanza-Sul lideram a lista de pedidos de financiamento, enquanto as províncias do leste do país, dada as dificuldades resultantes do longo conflito armado, têm enfrentado alguns constrangimentos. Ainda assim, o BDA pretende abrir uma agência regional na província da Lunda-Sul para facilitar o atendimento às províncias da Lunda-Norte e Moxico.
O Banco de Desenvolvimento de Angola tem como propósito principal o financiamento de projectos dos diversos agentes privados que absorvem o maior número de mão-de-obra, fomentando assim o emprego bem como o desenvolvimento sustentável do país.
Constrangimentos Na sua dissertação, Paixão Franco chamou a atenção para a informalidade do sector paralelo, pois este constitui uma ameaça ao desenvolvimento. Para o PCA do banco BDA, o mercado informal não se resume apenas às zungueiras e muito menos ao mercado Roque Santeiro em Luanda. “Existem empresas instaladas no centro da cidade de Luanda que não pagam impostos ao Estado. Não apresentam e nem têm contabilidade, mas quando pedem crédito ao banco e se lhes pede a contabilidade, dizem que o banco complica. Isto também é informalidade”, destacou.
O fraco fornecimento de energia eléctrica, o funcionamento deficiente dos portos e aeroportos, bem como a burocracia que se regista actualmente na obtenção dos diversos documentos para a constituição e certificação de uma empresa, também preocupam o PCA do Banco de Desenvolvimento de Angola.
Por outro lado, Paixão Franco entende que o uso de energia alternativa (eólica e solar), a construção de mini-hidroeléctricas, formação de pessoal próprio, internalização de tecnologias, planeamento das importações e a estruturação dos sectores de assistência técnica e de suprimentos constam das soluções práticas e eficazes para a solução de problemas específicos.


Fotos: Pedro Salvador